CRISTO E ANÁS – Manoel Coelho Jr. João 18: 19-24.




Enquanto Pedro negava a Cristo, Nosso Senhor é questionado por Anás, que ainda que não fosse oficialmente o sumo sacerdote, possuía grande influência religiosa e política naqueles dias. O Senhor Jesus passa, portanto, por um julgamento preliminar, antes de ir para o sumo sacerdote de fato, que era Caifás. Com estes dois acontecimentos, a negação de Pedro e respostas de Cristo a Anás, nós temos um paralelo entre o pecado e traição do discípulo, e a firme resolução do Mestre em obedecer ao Pai, com palavras verdadeiras e corajosas diante dos mesmos inimigos que Pedro temia. Estas comparações nós deixaremos para a próxima exposição. Nos deteremos agora nas respostas de Cristo neste julgamento. No entanto, ainda mais importante é o fato de Cristo estar resolutamente seguindo o caminho da Cruz, e que sobre Ele não se consegue atribuir culpa alguma.

Para entendermos melhor, olhemos o texto seguindo a narrativa que João nos oferece. Primeiro, ele trata do questionamento de Anás a Cristo e sua resposta. Em seguida, mostra-nos a reação de um dos policiais do Templo diante das palavras de Jesus, e também como Jesus responde a este. Tais acontecimentos nos trazem grandes lições sobre a maneira como Cristo reage em diferença a Pedro, e também a respeito da firme resolução do Senhor em se sacrificar por nós, e de sua plena inocência. Vamos meditar, então.
I - Cristo responde a Anás (19-21).
Antes de entrarmos no julgamento de Cristo em si, precisamos relembrar alguns acontecimentos que mostram claramente que tal julgamento não era imparcial. Na verdade, tanto Anás, como Caifás e as autoridades judaicas em geral, já tinham decidido matar o Nosso Senhor. Tudo ali era uma farsa, e eles somente queriam dar um ar de legalidade, quando no fundo não queriam fazer justiça, mas condenar Cristo de qualquer maneira. Para provar este fato, vamos olhar dois trechos das Sagrada Escrituras. Leia por favor:
1 - Jo 11: 45-54:
45 Muitos, pois, dentre os judeus que tinham vindo a Maria, e que tinham visto o que Jesus fizera, creram nele.
46 Mas alguns deles foram ter com os fariseus, e disseram-lhes o que Jesus tinha feito.
47 Depois os principais dos sacerdotes e os fariseus formaram conselho, e diziam: Que faremos? porquanto este homem faz muitos sinais.
48 Se o deixamos assim, todos crerão nele, e virão os romanos, e tirar-nos-ão o nosso lugar e a nação.
49 E Caifás, um deles que era sumo sacerdote naquele ano, lhes disse: Vós nada sabeis,
50 Nem considerais que nos convém que um homem morra pelo povo, e que não pereça toda a nação.
51 Ora ele não disse isto de si mesmo, mas, sendo o sumo sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus devia morrer pela nação.
52 E não somente pela nação, mas também para reunir em um corpo os filhos de Deus que andavam dispersos.
53 Desde aquele dia, pois, consultavam-se para o matarem.
54 Jesus, pois, já não andava manifestamente entre os judeus, mas retirou-se dali para a terra junto do deserto, para uma cidade chamada Efraim; e ali ficou com os seus discípulos.
Por ocasião da ressurreição de Lázaro, muitos creram em Jesus, o que levou as autoridades judaicas a ficarem muito preocupadas com a possibilidade de perderem o seu poder. Então Caifás, o sumo sacerdote, propõe de forma falsa, como que querendo salvar o povo, o assassinato de Nosso Senhor Jesus Cristo, convencendo os demais. Todavia, ainda que não soubesse, Caifás estava profetizando a morte de Cristo para a salvação dos seus eleitos. Mas observamos aqui que já tinham decidido matar a Cristo pela persuasão de Caifás, que procurava passar a ideia de que possuía uma boa intenção, quando na verdade só pensava no poder religioso e político, e via a Jesus como uma ameaça, tendo inveja do Senhor.
2 - Mt 26: 1-5; 55,56:
1 E aconteceu que, quando Jesus concluiu todos estes discursos, disse aos seus discípulos:
2 Bem sabeis que daqui a dois dias é a páscoa; e o Filho do homem será entregue para ser crucificado.
3 Depois os príncipes dos sacerdotes, e os escribas, e os anciãos do povo reuniram-se na sala do sumo sacerdote, o qual se chamava Caifás.
4 E consultaram-se mutuamente para prenderem Jesus com dolo e o matarem.
5 Mas diziam: Não durante a festa, para que não haja alvoroço entre o povo…
55 Então disse Jesus à multidão: Saístes, como para um salteador, com espadas e varapaus para me prender? Todos os dias me assentava junto de vós, ensinando no templo, e não me prendestes.
56 Mas tudo isto aconteceu para que se cumpram as escrituras dos profetas. Então, todos os discípulos, deixando-o, fugiram.
Observamos que o Senhor Jesus Cristo tinha plena consciência de que estava indo para o sacrifício na Cruz. No entanto, Caifás juntamente com as demais autoridades judaicas decide com dolo, observem, matar o Senhor Jesus Cristo. Ou seja, eles decidem matar a Cristo fraudulosamente. Eles iam praticar uma fraude. Tudo estava preparado. Eles não tinham interesse pela justiça, mas em matar a Cristo de qualquer maneira. Eram assassinos. Observemos, também, que eles não iam fazer isso durante a festa, para não causar alvoroço entre o povo, e que nunca prenderam Jesus quando falava publicamente no Templo. Ora, quando se quer cometer uma injustiça, procura-se fazer isso da forma mais secreta possível, para que nada seja descoberto em sua malignidade. O segredo e a mentira produzem a injustiça e a morte.
Chegamos, então, à conclusão que quando Nosso Senhor foi levado a Anás e Caifás, não estava diante de juízes isentos, que procuravam a justiça, mas homens extremamente maliciosos, que queriam na verdade matá-lo. Dessa forma podemos compreender que quando Anás pergunta a Cristo sobre sua doutrina e seus discípulos, não estava interessado em descobrir a verdade para fazer um juízo realista das coisas, mas desejava pegar Jesus em alguma falta em suas palavras, mesmo aparente, para levá-lo à condenação. Ele queria que Cristo se autoincriminasse.
Diante dessa tentativa, Nosso Senhor dá uma resposta muitíssima apropriada para o caso, apontando para a realidade de que nada, absolutamente nada do que tinha dito era desconhecido. Tudo que falara tinha sido de forma pública, tanto nas sinagogas como no Templo, locais onde os judeus se reuniam. Cristo falou ao mundo, Cristo falou publicamente, Cristo não falou nada em oculto. Sua doutrina não era secreta, mas pública. Ele não tinha nada a esconder. Sua doutrina não era subversiva, que provocava revoluções e desordens, ou herética, contrária a Moisés, mas era plenamente defensável, e todos que já a tinham ouvido, poderiam dar testemunho de suas palavras dessa forma. Por isso o Senhor solicita a Anás, que seus ouvintes possam dar testemunho. Com isso ficará claro que sua doutrina não tinha nada de errado. Com essas palavras o Senhor Jesus não se incrimina, e diferente de Anás e Caifás, que tudo faziam em secreto, mostra que na verdade não há nada com que possa ser acusado, pois sua doutrina era pública, e de forma pública era defensável. Cristo, não como Anás e Caifás, que conspiravam, escondendo suas reais intenções para matá-lo, nada disse em oculto, mas fazia pública a sua doutrina, não tendo nada a esconder (MT 26: 1-5; Jo 18: 19-21). A injustiça se promove na obscuridade, que encobre a maldade e parcialidade. Mas da clareza e sinceridade nas palavras e ações, nasce a justiça, mostrando-se os reais propósitos do coração.
Outro ponto importante é que com essas palavras o Senhor não tinha sido de forma alguma desrespeitoso com Anás. Este episódio se parece muito com aquele do apóstolo Paulo em Atos capítulo 23, dos versos 1 ao 5 vamos lê-lo:
1 E, pondo Paulo os olhos no conselho, disse: Homens irmãos, até ao dia de hoje tenho andado diante de Deus com toda a boa consciência.
2 Mas o sumo sacerdote, Ananias, mandou aos que estavam junto dele que o ferissem na boca.
3 Então Paulo lhe disse: Deus te ferirá, parede branqueada; tu estás aqui assentado para julgar-me conforme a lei, e contra a lei me mandas ferir?
4 E os que ali estavam disseram: Injurias o sumo sacerdote de Deus?
5 E Paulo disse: Não sabia, irmãos, que era o sumo sacerdote; porque está escrito: Não dirás mal do príncipe do teu povo.
Este texto tem as suas dificuldades, e não é meu propósito explicá-lo nesta ocasião. Mas desejo apenas chamar atenção para o fato de que o apóstolo Paulo reconhece que deveria respeitar o sumo sacerdote, conforme Êxodo capítulo 22, versículo 28, que nos diz:
A Deus não amaldiçoarás, e o príncipe dentre o teu povo não maldirás.
Podemos observar que Nosso Senhor não desobedeceu este mandamento. Não amaldiçoou o sumo sacerdote, nem foi desrespeitoso. Tudo que fez foi apontar para a verdade e pureza de sua doutrina, pois tinha sido publicamente anunciada, e solicita que isso fosse comprovado por ouvir-se os que tinham estado presentes por ocasião de seus ensinos públicos.
II - Cristo responde ao policial (22-24).
Diante dessas palavras de Nosso Senhor, um dos oficiais do Templo, de forma totalmente injustificável, dá uma bofetada em Cristo. Com essa ação violenta ele queria dizer, como suas próprias palavras mostram, que Cristo tinha sido desrespeitoso com o sumo sacerdote, o que não era o caso, como já tivemos oportunidade de analisar anteriormente. Aquilo evidentemente se tratava de um abuso de autoridade. Para provar basta lembrarmos do que Paulo diz em Atos capítulo 23 versículo 3, quando também recebeu uma agressão injustificável por ordem do sumo sacerdote Ananias. Naquela ocasião ele diz que o sumo sacerdote o feriu contra a lei, sendo que estava lá para julgá-lo conforme a lei. A lei das Escrituras não autoriza punição antes do julgamento, antes que o caso tenha sido tratado de forma justa, e tenha sido comprovado a culpa do acusado. Assim, aquele homem tinha cometido uma violência, e um abuso de autoridade.
Diante disso, Nosso Senhor responde. Talvez possamos estranhar, pois Ele havia dito, em Mateus 5, versículo 39, que devemos dar a outra face. É claro que quando o Senhor diz isso, não o diz no sentido literal, como se alguém ao ser esbofeteado na face oferecesse o outro lado literalmente. Isso seria inclusive ridículo e sem sentido. Mas o princípio por trás de Mateus 5:39, é que não devemos revidar, não devemos nos vingar, não devemos agir de forma alguma por vingança, tentando fazer justiça por nossa conta, com raiva, pois a ira humana não produz a justiça de Deus (Tg 1:20). No entanto, não vingar-se não significa necessariamente que sempre devemos nos calar. Realmente há momentos em que o silêncio é o caminho mais sábio e prudente. Mas há outros em que é necessário falar, não por vingança humana e injusta, mas para defender-se exatamente a justiça. Este é o caso aqui. Portanto, o Senhor Jesus Cristo responde aquele policial violento, e a sua resposta busca a justiça em dois aspectos:
Primeiro, o Senhor solicita, de forma serena, que o policial dê testemunho se Ele falou algum mal em suas palavras ao sumo sacerdote, o que evidentemente incluía o conteúdo como a forma de falar. Que o policial dê provas ou evidências disto. O que temos aqui é o princípio de que ninguém deve ser condenado, e ninguém deve ser punido simplesmente pelos rompantes violentos de uma autoridade. Mas tudo deve ser apresentado às claras, as provas e as evidências devem estar presentes a respeito da culpa daquele que está sendo julgado, para que então seja punido justamente. Sem isso há injustiça. Este foi o caso da ação violenta do policial contra o Senhor Jesus Cristo. Foi uma ação totalmente injusta porque veio sem provas de que Jesus tinha falado o mal ao sumo Sacerdote.
Segundo, se não há evidências de que Cristo falou mal, mas que, ao contrário, falou bem, qual o motivo de ele ser punido daquela forma tão violenta. Assim, a punição foi totalmente injusta por não ter base na culpa de Cristo, mas apenas no rompante violento daquele policial. Por outro lado, as palavras de Cristo também devem mostrar que a própria ação violenta era errada e injusta em si mesma. Jesus estava preso, não poderia se defender, e este homem se aproveita e o fere. Isso é covarde e injusto.
Finalmente, João conclui o relato do julgamento de Cristo diante de Anás com versículo 24, informando que o mesmo mandou Cristo amarrado ao sumo Sacerdote Caifás. Anás tentou, mas não conseguiu apontar nenhuma culpa no Senhor Jesus Cristo. O policial violento agrediu a Cristo de uma forma totalmente injustificada, mas também não conseguiu responder a palavra de Cristo, mostrando que havia alguma culpa nEle. Enfim, Cristo era totalmente inocente, poderia ter sido solto naquele momento, mas não seria, pois a Anás e Caifás,e as demais autoridades judaicas, já tinham decidido matá-lo com dolo. Todavia, por trás de tudo isso, temos a verdade de que o Amado Salvador Jesus Cristo era Santo, inocente, e, portanto, totalmente apto para ser sacrificado por nossa salvação, o que Ele efetivamente veio realizar.
III - Conselhos:
1 - Em todas as nossas relações com o próximo busquemos fazer justiça, seguindo o exemplo de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Isso só será possível, se como Cristo, formos claros, sinceros, sem duas faces, sem hipocrisia, se nós não conspirarmos, mas agirmos com transparência diante de nossos próximos. Mentira não é coisa dos seguidores de Cristo, mas do maligno. Mentira não produz justiça, mas é fonte de injustiças. É na verdade que a justiça é promovida. Portanto, não se envolva com mentiras, nem se deixe levar por elas, promovendo-as. Mas fale a verdade, e promova a verdade, para que a justiça seja realizada.
2 - Respeitemos as autoridades, mesmo que sejam ímpias, pois esta é a vontade de Deus, e por Ele foram colocadas naquela posição. Podemos, em ocasiões necessárias para a promoção da justiça, falar de forma contrária aos seus procedimentos. Mas mesmo assim, devemos fazer isso de maneira respeitosa, como Jesus Cristo fez aqui.
3 - Por outro lado, quando nós tivermos em posição de autoridade, não devemos abusar dela como fez Anás, intimidando Cristo, e especialmente o policial violento, que bateu em Nosso Senhor de forma totalmente injustificável. Autoridade, conforme Cristo ensinou em outra parte, é para servir, não para dominar, abusar, humilhar, violentar, destruir (Mt 20: 25-28). Autoridade alcança respeito não pela violência e arrogância, mas pelo serviço em humildade. Que tenhamos, portanto, uma mansa autoridade, uma servil autoridade, para a glória de Deus e o bem de nossos próximos.
4 - Não nos vinguemos. Não sejamos violentos como este policial. A tortura, a violência, contra aquele que está incapaz de se defender, é algo injustificável. Não nos vinguemos, mas demos a outra face. Não sejamos violentos, mas mansos. Hajamos como Cristo, que não se vingou, mas de acordo com a justiça, e para defendê-la, falou de forma sensata, sábia, tranquila, serena e precisa.
5 - Sejamos gratos ao Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Tudo isso Ele passou, submetendo-se, para cumprir a vontade do Pai, bebendo completamente o cálice de dor e sofrimento para nossa salvação. Como devemos ser gratos ao Nosso Senhor, lembrando que ali estava o inocente Jesus, o puro Jesus, Aquele que era totalmente apto, o Cordeiro de Deus imaculado, pronto para ser sacrificado para nossa salvação. Que sejamos gratos, e vivamos a cada dia em honra ao Nosso Amado Salvador Jesus Cristo. Amém!
*Esboço do sermão do Culto Público de 20 de novembro de 2022. Você pode distribuir este material livremente. Pedimos apenas que indique esta pagina para mais pessoas serem edificadas na Verdade em Jesus.

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